CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO
Pela Medida Provisória nº 1.925-1, de 11 de novembro de 1999 (a mais recente republicação tem o número 1.925-3 de 6 de janeiro de 2000), o Governo Federal criou a Cédula de Crédito Bancário-CCB, uma nova modalidade de título de crédito, a ser emitido por pessoa física ou jurídica em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada (art. 1º). Cópia da Medida Provisória
Apesar da semelhança no nome (cédula de crédito), o registrador precisa ficar atento a uma série de diferenças entre a CCB as outras cédulas de crédito já conhecidas, conforme veremos abaixo.
O REGISTRO DA CÉDULA:
As outras modalidades de cédulas às quais o registrador está acostumado a registrar (rural, industrial, comercial, à exportação e do produto rural), são sempre registradas no livro 3 e, se houver garantia hipotecária, também no livro 2. Nestas cédulas já conhecidas, o que se registra no livro 3 é a própria cédula.
Já a CCB - Cédula de Crédito Bancário - não será registrada em nenhum livro do Registro de Imóveis. Vale repetir: não se registra a cédula de crédito bancário. Registra-se apenas a garantia, isso se este registro da garantia for da competência do registrador imobiliário.
Compreenda-se, então, a primeira grande diferença da CCB com as demais cédulas de crédito: na CCB, o que se registra não é a cédula mas apenas a garantia. E o registro da garantia será feito no Registro de Imóveis ou no Registro de Títulos e Documentos, ou ainda em outro órgão público, conforme for a modalidade da garantia prestada.
Assim, se a garantia for hipotecária, registra-se apenas a hipoteca (no livro 2) do Registro de Imóveis.
Se a garantia for pignoratícia, registra-se apenas o penhor (no livro 3) do álbum imobiliário. Isso se for modalidade de penhor cuja competência registral é do Registro de Imóveis. Apenas para recapitular, são de competência do Registro de Imóveis os seguintes penhores:
Todos os demais penhores são de competência registral do Registro de Títulos e Documentos, como é o caso do penhor comum e o do penhor mercantil. Portanto, garantia pignoratícia de penhor comum ou de penhor mercantil, o registro deve ser feito no serviço registral de títulos e documentos.
Quando a garantia da CCB for de alienação fiduciária de coisa móvel (que não seja veículo automotor) o registro será sempre no Registro de Títulos e Documentos (art. 129, 5º, in fine, da Lei nº 6.016/73).
A CCB garantida por alienação fiduciária ou por penhor de veículos automotores, deverá ser registrada apenas no órgão de trânsito que atua no registro de aquisição ou transferência de direitos (art. 11). A nova lei determinou expressamente que basta o registro no órgão de trânsito, conferindo a este registro eficácia constitutiva da garantia. Isto não impede que a garantia venha a ser inscrita no serviço de Títulos e Documentos, conforme a regra geral da Lei dos Registros Públicos. Apenas ressalvo que, neste caso, a CCB se faça acompanhar de requerimento escrito de pedido de registro (do credor ou do devedor), e isto por cautela e para que não se venha a alegar registro indevido por parte do registrador.
Quando a garantia for caução de direitos não imobiliários (caução de títulos de crédito), o registro será feito no Registro de Títulos e Documentos.
Quando a garantia for caução de direitos imobiliários (caução de crédito hipotecário, caução de direitos em contrato de promessa de compra e venda etc.) é feita no Registro de Imóveis a averbação à margem da inscrição ou, pelo sistema atual, averbada na matrícula que contém o registro do direito caucionado.
Quando a garantia for de alienação fiduciária de imóvel(*), o registro será sempre no Registro de Imóveis (art. 167, I, 2, da Lei nº 6.015/73 e art. 23 da Lei nº 9.514, de 20.11.1997).
(*) Há alguma discussão relativamente à possibilidade de utilizar-se a alienação fiduciária de imóvel como garantia de cédula. Há aqueles que afirmam que esta modalidade de garantia pode ser utilizada apenas em contratos imobiliários. Outros, aos quais me filio, entendem que a Lei nº 9.514/97 não criou tal limitação e que, portanto, a propriedade fiduciária poderá servir para garantia de qualquer contrato. Fica apenas o registro de que a discussão ainda não encontrou solução unânime.
LOCAL DO REGISTRO
O registro das garantias da CCB deve ser feito segundo as regras normais de determinação da competência registral.
A CCB garantida por hipoteca ou alienação fiduciária de imóvel, será registrada no ofício imobiliário da situação do imóvel.
A CCB garantida por penhor, no local de depósito ou localização dos bens apenhados. Repito que a garantia de penhor deverá ser registrada no ofício imobiliário (quando se tratar de penhor de máquinas e aparelhos instalados e em funcionamento na indústria, ou de penhor rural), ou no Registro de Títulos e Documentos (quando se tratar de penhor mercantil ou de penhor comum).
A CCB garantida por alienação fiduciária de bem móvel, deverá ser registrada no Registro de Títulos e Documentos da localização do bem.
O penhor ou a alienação fiduciária de veículo automotor será registrada no órgão de trânsito, conforme a competência específica.
DOCUMENTOS FISCAIS, CERTIDÕES NEGATIVAS E OUTROS DOCUMENTOS
A Medida Provisória em destaque não criou nenhum privilégio para as CCB, no que tange às certidões negativas e outros documentos, fiscais ou não. Aqui está outra diferença com as demais cédulas, porquanto em outras cédulas dispensa-se CCIR, ou reconhecimento de firma, ou CNDs, ou prova de quitação do ITR, etc. Na CCB, nenhuma dispensa, nenhuma exceção foi criada.
Portanto, devem ser apresentados ao Registro de Imóveis (ou ao Registro de Títulos e Documentos), juntamente com a cédula:
- As CNDs do INSS e da SRF, que são exigíveis das empresas para oneração de bem imóvel de qualquer valor ou de bem móvel de valor superior a R$15.904,18 (Ordem de Serviço INSS/DAF nº 207 de 08.04.1999).
- A prova de quitação do ITR (últimos cinco pagamentos ou certidão negativa da SRF) que é exigível para oneração de imóveis rurais situados na zona rural (Lei nº 9.393/96 e Instrução Normativa da SRF nº 33, de 14-04.1997).
- A certidão negativa do IBAMA, que é exigida para onerar imóveis rurais (art. 37 do Código Florestal - Lei nº 4.771, de 15-09-1965).
- O CCIR (certificado de cadastro) do INCRA, que é documento indispensável para hipotecar imóveis rurais, sob pena de nulidade (art. 22, § 1º, da Lei nº 4.947, de 06-04-1966).
- A prova da legítima representação das empresas, que deverá ser apresentada juntamente com a cédula (como são os casos de procurações ou de contratos sociais).
- O reconhecimento de firmas de todas as partes envolvidas na emissão da cédula não foi dispensada na medida provisória ora examinada, motivo pelo qual, em sendo apresentada para registro no Registro de Imóveis, deverá obedecer à regra geral do art. 221, II, da Lei nº 6.015/73, ou seja, estar com as firmas reconhecidas.
HIPOTECA CONSTITUÍDA EM INSTRUMENTO PARTICULAR
A CCB é mais uma das tantas exceções que o legislador vem criando, em número cada vez mais crescente, à regra do art. 134, II, do Código Civil.
Pela regra geral do Código Civil, a escritura pública é da essência do ato de constituição de direitos reais imobiliários. No entanto, como acontece com as cédulas de crédito já conhecidas (rural, industrial, comercial, à exportação e do produto rural), poderá ser validamente instrumentalizada a constituição de garantia real (a hipoteca ou, com a ressalva já feita em nota de destaque, a propriedade fiduciária) no instrumento particular - cédula de crédito bancário.
Considero que a crescente utilização dos instrumentos particulares para instrumentalizar acordos de transmissão ou de constituição de direitos reais, relativos a imóveis, é fator de insegurança jurídica. A experiência prática, o dia-a-dia do serviço registral, tem demonstrado quão incompletos são os documentos feitos sem assistência do notário. Muitas das vezes, inclusive, estes instrumentos particulares não têm condições nem de remendo, causando perturbação ao indivíduo e à comunidade.
Mas, seja como for, por força do que estatuem os art.s 2º, 6º e 7º da Medida Provisória nº 1.925-1, de 11.11.1999, a garantia real imobiliária pode ser instrumentalizada na própria cédula, devendo ser levada ao registro competente para a constituição do direito real (art. 18).
ARQUIVAMENTO DE UMA VIA DA CÉDULA
Por se tratar de instrumento particular, uma via "não negociável" deverá ficar arquivada no registro imobiliário ou no de títulos e documentos.
Evidentemente, os serviços autorizados a microfilmar ou a escanear documentos ficam dispensados do arquivamento de uma via do documento.
No Registro de Imóveis, o arquivamento será feito em pasta comum, ou seja, juntamente com os outros documentos apresentados para registro, conforme a estrutura de arquivo de cada serviço. Alerto para que as vias "não negociáveis" das CCBs não precisam ser arquivadas em pasta própria como ocorre com as outras cédulas (rural, industrial etc.).
EMOLUMENTOS PELO REGISTRO DA CCB
O registro das garantias constituídas nas CCBs seguem as regras normais relativas a todos os títulos. Nenhuma exceção foi criada pela nova lei.
Assim, é pelo valor da dívida que serão cobrados os emolumentos.
Apenas para exemplificar, tomemos alguns casos:
a) CCB com garantia pignoratícia - 1 registro no livro 3 - emolumentos pelo valor total da cédula.
b) CCB com garantia hipotecária de 1 imóvel - 1 registro no livro 2 - emolumentos pelo valor total da cédula.
c) CCB com garantia hipotecária de 2 ou mais imóveis - 2 ou mais registros no livro 2 - emolumentos calculados pelo total da dívida dividido pelo número de imóveis (mesmo sendo imóveis de diferentes circunscrições imobiliárias, faz-se a divisão).
d) CCB com garantia pignoratícia e hipotecária - 1 registro no livro 3 - emolumentos pelo total da dívida; 1 ou mais registros no livro 2, conforme o número de imóveis: se for apenas 1 imóvel, o registro no livro 2 será também pelo total da dívida; se forem 2 ou mais imóveis, divide-se o valor pelo número de imóveis).
Como se vê, no sistema de cobrança de emolumentos, há muita semelhança com o que ocorre nas cédulas de crédito industrial, quando estas geram registros no livro 3 e no livro 2.
As cédulas emitidas em moeda estrangeira (quando o credor for domiciliado no exterior - § 2º do art. 1º), se na cédula não constar o valor de conversão em reais, terão os emolumentos calculados pela cotação oficial da moeda no dia da emissão. Recomendo a adoção da cotação do dia da emissão da cédula para evitar que, caso a cédula deva ser registrada em dois ou mais serviços registrais diferentes, resulte em emolumentos diferentes. É que se for aplicada a cotação da moeda no dia do registro, como cada registro será feito em dia diferente, resultará em valor de conversão diferente e, consequentemente, em emolumentos diferentes, o que depõe contra a própria classe.
Estes são apenas alguns tópicos que se manifestam, numa primeira análise. Manifestar-se sobre lei nova é sempre um exercício de risco. Críticas e argumentações diferentes serão sempre bem-vindas.
Pelotas, Janeiro de 2000.